quarta-feira, 23 de junho de 2010

Indo embora


Já era quase dia, eu ainda perambulava pela rua, indo para uma daquelas casas temporárias, quando passei por ti. Não foi amor a primeira vista, por que não existe toda essa besteira. Só me encantei pelos teus olhos pretos, amendoados e levemente entristecidos. Continuamos andando, em direções opostas, eu ainda embriagada pela música, tu por um copo de leite. É eu sei que foram mais do que dois, pois teu bigode e teu humor denunciavam. Antes de passar por ti completamente, minha mente pediu para  te ver mais, foi  quando olhei para trás. Lá estava tu, o pequeno mais intrigante, com um sorriso nos olhos, parado. Dei meia volta  me aproximei. Foram perguntas apenas retóricas e também desnecessárias, talvez constrangedoras, pois só podias responder com poucos grunhidos. E ainda sim respondias. 
Quando chegou a porta do meu quarto te pedi para ir embora, fiz de tudo: contei mentiras,  te expulsei, joguei água, fingi ir embora, até me jogar da janela tentei, mas só retorcias o corpo e continuava parado, quieto, tentando me decifrar. Não desistirias. Então, olhei em teus olhos e, em voz baixa, contei quem sou. Não em poucas palavras, entretanto em mil metáforas. Achei que te deixaria tonto e que me deixarias sozinha. Não fizeste. Latiste num tom grave, provavelmente, dizendo que havia entendido tudo. Era implícito, como podias ter entendido? Não tive outra escolha, todo aquele temperamento me conquistou, passei a mão pelo teu pêlo e te mandei entrar no meu quarto. Mais uma vez me surpreendeste, não entraste, andaste em circulo e deitaste na porta. Para tomar conta de mim? Quem disse que eu precisava?! Fechei a porta. Impetuosa, deitei na cama. Meu pensamento não saia de ti. Nesse meio tempo só o Caio conseguiu dizer: "Não, você não sabe, você não sabe como tentei me interessar pelo desinteressantíssimo". Li mil livros, até assisti televisão, procurei amigos para comprar. Continuavas ali, na minha mente.
Eu era tão previsível, será que já sabias como desvendar tanto mistério forçado? Passei dias, trancada no quarto, sem coragem para saber se ainda estavas lá. Na primeira vez estiveste, no entanto não mais te convidei para entrar, tive medo. Preferi te dar tempo, me dá alguns dias. Na segunda, talvez, tenhas ido atrás de algo para comer, foi quando eu sentei na porta e comecei a chorar...
Adormeci, esperando uma lambida para despertar daquela ausência. 


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