terça-feira, 22 de setembro de 2009

Surpresa




Compulsivamente elas caiam, sem que pudesse controlar, sem que tivesse força para impedi-las. Há anos elas não apareciam. Não nasciam. Não morriam. Elas desesperavam, maltratavam, mas ainda assim confortavam meu coração desamparado. O silêncio era lamento. Os olhos de vidro fixados na loucura, no ápice da minha felicidade e do meu descontentamento.
Ela partiu! Nem ao menos olhou nos meus olhos. Nenhum abraço. Nenhum carinho. Apenas partira como de costume, de surpresa. Só conseguia pensar que nunca mais escutaria aquela voz doce e melosa, pedindo café da manhã na cama. Nem ouviria aquela gargalhada contagiante diante das minhas insistentes cócegas. Nem limparia aquelas lágrimas de felicidade após um simples sorvete de morango, nosso preferido. Não veria o sorriso nascer timidamente ao som de um elogio.
Ela partiu. Ela partiu. Ela partiu. A frase pulsava doloridamente nas veias cada vez que recordava a ingenuidade com que aquele amor nascera. A vingança acomodava-se em meu peito quando uma lágrima nascia, descia, banhava. Assustava.
Em acessos de loucura tirei-a do seu novo casulo. Beijei. Abracei. Resmunguei. Refiz minhas promessas. Declarei meu amor. Fria. Imóvel. Não respondeu, calou.
O silêncio gritou nos meus ouvidos: REALIDADE! A fúria da dor bagunçou meus sentidos. As imagens perderam os cheiros. O som ficou sem cores. E o silêncio cantava: A - DEUS!